Comentário do do Acórdão do STA de 10/09/2020:


Serve o presente artigo para fazer uma análise do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de setembro de 2020, em concreto os seguintes pontos : “I - A declaração de ilegalidade de normas imediatamente operativas com efeitos circunscritos ao caso concreto pode ter como fundamento a violação de normas e princípios constitucionais, sobretudo se esse pedido visa a desaplicação ao requerente de uma medida proibitiva no âmbito de um processo urgente de intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias;”


Breve enunciação dos factos: 


O presente acórdão trata um pedido de intimação dos direitos liberdades e garantias contra a Presidência do Conselho de Ministros, requerendo a “declaração de inconstitucionalidade, com efeitos circunscritos a si das normas proibitivas de ajuntamentos retiradas da conjugação dos pontos 1, 2 e 8 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 55-A/2020(…) assim como quaisquer normas análogas que viessem a ser aprovadas” e também, a “condenação da Presidência do Conselho de Ministros a exercer a sua competência relativamente às forças policiais e demais autoridades públicas no sentido de não impedirem o Requerente e as pessoas que com ela venham a estar reunidas de exercer plenamente a sua liberdade jusfundamental de reunião.”

Veio a Presidência do Conselho de Ministros defender se invocando que os Tribunais Administrativos e Fiscais não tinham jurisdição para o caso em apreço, a ilegitimidade passiva do Conselho de Ministros, a não adequação do meio processual e a incompetência hierárquica do STA para e ainda a conformidade constitucional das normas em questão. 


Análise em concreto: 


  • Quanto à falta de jurisdição dos Tribunais Administrativos e Fiscais: Está em causa a aplicação do art 73º2 do CPTA artigo que abrange os casos em que o autor invoca a inconstitucionalidade da norma impugnada e os tribunais pronunciam a ilegalidade da norma com aplicação circunscrita à situação do interessado, excluindo-o do seu âmbito de aplicação. No entanto a aplicação desta norma não é unanime na doutrina. O professor Vasco Pereira da Silva considera que não faz sentido que um processo destinado a apreciar a legalidade de um regulamento a título principal, tenha como resultado, verificada a existência dessa invalidada, uma declaração de ilegalidade de uma norma geral e/ ou abstracta, mas que só vale para aquele caso concreto. No entanto o STA considera a possibilidade de qualquer lesado de uma norma operativa poder obter tutela jurisdicional, in casu com a desaplicarão da mesma com efeitos circunscritos ao caso concreto. O STA considerou também que o pedido não viola a reserva de jurisdição constitucional , uma vez que o pedido refere a declaração de inconstitucionalidade com efeitos circunscritos ao caso concreto: a autora quer que a norma seja desaplicada ao caso concreto e não está a requerer a desaplicarão da norma com força obrigatória geral. 
  • Quanto à falta de legitimidade processual: o STA refere que o meio utilizado pela autora é a única forma de se assegurar a praticabilidade do art 268º/5 c) da Constituição da República Portuguesa. Na verdade se não se aceitasse esta concepção do STA poder-se ia vedar o direito de um cidadão proteger os seus direitos, uma vez que o entendimento do 281º CRP impossibilita um cidadão recorrer ao Tribunal Constitucional com o fundamento da inconstitucionalidade de normas, estando este acesso restrito às entidades referidas no art 281º/2 CRP.
  • Quanto à legitimidade passiva da Presidência do Conselho de Ministros: a legitimidade passiva corresponde à contraparte na relação material controvertida, tal como esta é configurada pelo autor (art. 30ºCPC). A legitimidade passiva vem no art 10º descrita como quem deva ser demandado na aças com o objecto configurado pelo autor, não sendo esta legitimidade aferida de acordo com critérios processuais mas sim substantivos. Inicialmente 
  • O STA deu razão à requerida, uma vez que a autora pretende impugnar a legalidade de uma resolução do Conselho de Ministros , tendo-se dirigido erradamente à Presidência do Conselho de Ministros, configurando-o como parte passiva (10ºnº1). No entanto o STA , considerando estar em curso um processo urgente e fazendo uma ponderação de interesses, acaba por desconsiderar a diligência processual dilatória tendo em conta a estreita distância entre o Conselho de Ministros e a Presidência do Conselho de Ministros pondo em pratica o principio da celeridade da justiça (20º CRP)
  • Quanto aos requisitos processuais para a urgência do processo: o art 97º remete para o regime da ação administrativa em matéria de pressupostos processuais, sendo aplicável quase todo o regime. A legitimidade afere-se através da elegibilidade, sendo uma categoria próxima à do titular de direito. Este tipo de processo tem como objectivo a emissão de uma decisão em tempo útil , sendo mais rápido que o processo comum. Uma parte da doutrina considera que não se deve limitar este tipo de processo aos DLG do artigo 20º5 CRP aplicando se a qqr direito análogo aos presentes no art 17º CRP. Para que este tipo de ação proceda é preciso prova de que o resultado desejado não pode ser atingido de outra forma, o que a meu ver se verifica. 


Maria do Carmo Carvalho Duarte

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