Tema obrigatório
Discussão dos dois
primeiros pontos do Acórdão
I - A declaração de
ilegalidade de normas imediatamente operativas com efeitos circunscritos ao
caso concreto pode ter como fundamento a violação de normas e princípios
constitucionais, sobretudo se esse pedido visa a desaplicação ao requerente de
uma medida proibitiva no âmbito de um processo urgente de intimação para a
proteção de direitos, liberdades e garantias.
Este primeiro ponto do
sumário implica a análise do art.º 73º/2 CPTA relativo à declaração de
ilegalidade de normas imediatamente operativas (ou seja, normas que produzem os
seus efeitos imediatamente, não dependendo de qualquer outro ato para o efeito)
cujo efeito se repercute a um caso concreto.
Este artigo é convocado
porque, no Acórdão em análise, passa-se o seguinte:
O Autor vem requerer
declaração de inconstitucionalidade, com efeitos apenas para si (pessoais) e
não para a generalidade dos destinatários das normas (sem força obrigatória
geral), de normas da Resolução do Conselho de Ministros n.º 55-A/2020, alegando
que estas normas põem em causa os direitos, liberdades e garantias
constitucionalmente protegidos.
Ora, se o que se pretende
é declarar ilegalidade de normas por se considerarem inconstitucionais, surge
uma questão: o art.º 73º/2 CPTA permite que seja o STA a declarar a ilegalidade
das normas da Resolução do Conselho de Ministros com fundamento na respetiva
inconstitucionalidade, ou, pelo contrário, consagra a reserva de jurisdição
constitucional?
Isto é, pode ser o STA a
declarar a ilegalidade das normas da Resolução do Conselho de Ministros com
fundamento na sua inconstitucionalidade, ou essa declaração, por ser,
justamente, de inconstitucionalidade está exclusivamente reservada ao Tribunal
Constitucional?
Esta questão é um dos pontos
apresentados pela Presidência do Conselho de Ministros na sua defesa por
exceção, quando alega a falta de competência jurisdicional dos tribunais
administrativos para resolverem este processo.
Como refere o Acórdão, a
resposta àquela pergunta suscita diversas posições doutrinárias.
Alguns autores pronunciam-se no sentido
da inconstitucionalidade da norma 73º/2 CPTA, por violar a disposição
constitucional 221º (que determina que a administração da justiça em matérias
de natureza jurídico-constitucional compete apenas ao Tribunal Constitucional).
Estes autores invocam, portanto, a violação da reserva de jurisdição
constitucional e a impossibilidade de se fazer uma interpretação do art.º 73º/2
conforme à Constituição.
Outros autores, defendem
a não inconstitucionalidade do art.º 73º/2 CPTA, na medida em que a sua
interpretação deve ser conjugada com os art.º 280º CRP e art.º 70º LTC: os
Tribunais Administrativos podem efetuar o controlo difuso de fiscalização
concreta (280º CRP) e à reserva de jurisdição do Tribunal Constitucional cabe
apenas a declaração de inconstitucionalidade de normas com força obrigatória
geral (281º CRP).
Neste sentido, a
desaplicação (entenda-se, recusa de aplicação) de uma norma no caso concreto
(no âmbito do art.º 73º/2 CPTA) é sempre passível de recurso para o Tribunal
Constitucional de acordo com o art.º 280º CRP – sendo este que tem a última
palavra sobre a decisão de inconstitucionalidade de normas.
A posição adotada pelo
Tribunal vai ao encontro deste último entendimento: a pretensão do autor é um:
“pedido de declaração de ilegalidade com efeitos pessoais”, isto é, é um
pedido de “desaplicação da proibição normativa contemplada em norma
administrativa” apenas para si mesmo, o que é a única forma de o Autor
obter tutela.
O Tribunal acrescenta que
ao Tribunal Constitucional está “apenas reservada a decisão final quanto à
conformidade constitucional de uma norma administrativa que seja imediatamente
operativa, em via de recurso da decisão do tribunal”.
II - A apreciação dos
pressupostos processuais no âmbito da intimação para a proteção de direitos,
liberdades e garantias tem de atentar nas especiais características deste meio
processual enquanto instrumento, entre nós, de obtenção de amparo
constitucional;
Este ponto do sumário
convoca a análise da intimação enquanto meio processual. Isto porque o Réu
afirma que este meio processual utilizado pelo réu é impróprio para fazer valer
o seu pedido, na medida em que ele “apenas pode ter como «resultado» uma
sentença condenatória e não pode ser utilizado como «meio impugnatório»”.
Porém, o Tribunal não
concorda com a argumentação do Réu, afirmando que a intimação é um meio
processual de grande elasticidade que assegura em tempo útil e com uma decisão
de mérito os direitos dos lesados que não ficam suficientemente protegidos
através de outros meios processuais.
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